sábado, 28 de outubro de 2006

Rebuliço na cidadezinha

Quem conta um conto, aumenta um ponto. Ou algo assim. Esse, que vou contar, aconteceu numa cidadezinha do interior de Minas, se bem que poderia ser também da Bahia, ou de qualquer outro estado: isso fica á sua escolha.
Certo dia, nesta cidadezinha, um marciano – que vinha de marte, afinal de contas o sistema solar tem outros planetas e a terra não é necessariamente sua primeira parada – aterrissou na pracinha da cidade (aquele tipo de pracinha que toda cidadezinha têm, vocês me entendem). Não deu em outra. Alvoroço geral. Medo; revolta; surpresa, todo tipo de sentimento idiota que um ser humano pode ter foi sentido naquele dia. O que poderia ser feito? Bem, criaram uma comitiva de líderes da cidade, e lá foram recepcionar o marciano.
Ele era tudo aquilo que a melhor ficção cientifica podia supor: baixinho, verde, com antenas e olhos esbugalhados. Mas não é que o desgraçado falava português?! Cumprimentou toda a comitiva com o melhor da elegância e dos bons costumes. Se tivesse um chapéu, teria tirado durante a reverência que fez.
Antes que eu me esqueça, os líderes da comitiva eram, respectivamente, o prefeito, o padre e o delegado; ambos da cidadezinha. Os “três poderes” da cidade. Voltando ao marciano, ele logo chegou dizendo de supetão:
­- Venho em missão de paz.
O delegado, aquele de cidadezinha mesmo, sempre desconfiado, olhou apreensivo pro marciano. O padre, fez o sinal da cruz. O prefeito estava pensando se esta situação lhe serviria para a reeleição...
Então, na velocidade proporcional à sua ignorância, o delegado disse:
- Paz uma ova! Você veio pra conquistar a terra, pensa que eu não vejo tv?! Já assisti a vários filmes sobre isso (sic).
- isso o quê? Perguntou o marciano quase ofendido.
O prefeito, agora acordado de seus devaneios políticos, disse:
- Calma minha gente, vamos ouvir o que o marciano tem a dizer.
O marciano, que tinha a paciência de Odisseu – aquele da Ilíada – realmente não tinha ficado ofendido com as palavras do delegado. E disse, em seguida:
- Venho em missão de paz. Marte, após muito tempo, decidiu se comunicar com os planetas do sistema solar. Venho em nome de minha nação trazer conhecimentos que a raça humana não possui.
- Que tipo de conhecimento? Perguntou o padre, e logo remendou: - Que não seja religioso, pois já temos nosso Deus!
- “Não é nada disso”, falou o marciano. “Trago conhecimento sobre a arte da convivência humana e da paz entre os povos. Nós, os marcianos, também tivemos problemas de convivência, como vocês, humanos. Porem, resolvemos todos eles. E agora, vivemos numa sociedade que vocês chamariam de utópica..
Mas e os ladrões, estupradores, assassinos e políticos no seu planeta, perguntou o padre.. – O que fizeram com eles?(O prefeito olhou de cara feia).
O marciano, meio desconcertado, disse: Bem...nós não temos esses tipos de indivíduos por lá.
- E com os pobres e aflitos, o que fizeram? Questionou o prefeito.
Respondeu, meio desolado, o marciano: “nós também não temos esse tipo de pessoas por lá”. Até parecia que o marciano adquirira um leve tom avermelhado, pensou mas tarde o delegado. Mas, se convenceu que era apenas uma impressão.
O delegado, então, perguntou: Que problemas vocês tinham, então?
O marciano ficou sem resposta. Seus problemas intergalácticos pareciam um grão de areia numa praia, uma gota no oceano, ou seja, toda comparação superlativa que pode vir à nossas mentes.
O ser de marte deu a volta em seus calcanhares (se é que tinha um par deles), entrou em sua espaçonave e foi embora mais rápido do que tinha chegado. Não entendia como um povo podia viver daquele jeito. Em sua análise da Terra, não tinha notado tamanha situação hostil. Guerra, fome e doença. E ao olhar para trás, vendo o planetinha azul pensou num nível de consciência ainda desconhecido: "como é forte esse povo..."